
Breve retrospectiva
Ao retomar a Lei nº 7.960, de 21 de dezembro de 1989, que instituiu a prisão temporária, pode-se aferir que esta foi criada com o objetivo de assegurar a eficácia das investigações criminais quanto a alguns crimes graves e dar cabo da famigerada "prisão para averiguações" onde pessoas são capturadas aleatoriamente pelos órgãos de investigação afim de "verificar" se as mesmas possuem ligação com violações das normas e histórico criminoso, mesmo que não sem haver flagrante ou autorização judicial, caracterizando evidente abuso de autoridade, nos termos do art. 9º, caput, da Lei n. 13.869/19.
De acordo com o jurista Diaulas Costa Ribeiro a prisão temporária é uma modalidade diferente da prisão para averiguação. A temporária teria sua justificação na fase investigativa do processo, onde já existe um fato criminoso delimitado no tempo e no espaço, com um autor já caracterizado. Caracterização essa diametralmente oposta a da prisão para averiguações onde prende-se pessoas, de forma aleatória para depois "descobrir crimes que não estavam sequer investigando ou para apurar crimes nos quais essas pessoas nem ao menos figuravam como suspeitas, caracterizando o que vulgarmente se conhece como ‘operação arrastão’, realizada em áreas de contingente criminoso e cujo único critério utilizado para limitar o direito de ir e vir é a simples presença nesses locais."
A prisão temporária é uma espécie de prisão preventiva e a lei em si estabelece requisitos:
I – quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;
II – quando o indiciado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao
esclarecimento de sua identidade;
III – quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:
a) homicídio doloso (art. 121,
caput, e seu § 2º);
b) sequestro ou cárcere privado.... etc.
O fato é que além da discussão sobre a constitucionalidade da lei, a qual surgiu por meio de iniciativa de Medida Provisória, - assunto que não discorreremos aqui - a medida tinha uma miríade de correntes pairando sobre sua interpretação, algumas afirmando que os incisos deveriam ser apenas alternativamente aplicados, outras correntes afirmavam o contrário, que os incisos deveriam ser seguidos de forma cumulativa, não se podendo decretar prisão temporária por apenas um deles.
Outra ainda, afirma que junto à última leitura, devia-se aplicar também uma das hipóteses que autoriza a prisão preventiva. Existem outras que ainda selecionam um tipo esquematização onde o inciso III deveria sempre estar presente combinado alternando entre o I e II, e outra ainda, onde a obrigatoriedade seria apenas do inciso I combinado ao III.
Nas discussões jurisprudenciais o assunto toma grande dimensão e a corrente majoritária considerava que somente é possível decretar a prisão temporária quando houver fundadas razões de autoria ou participação do indiciado nos crimes listados no inciso III do art. 1º, associada à imprescindibilidade da segregação cautelar para a investigação policial ou à situação de ausência de residência certa ou identidade incontroversa. Tendo em conta tratar-se a prisão temporária de espécie de prisão cautelar, conjugam-se, assim, seus pressupostos: 1) fumus comissi delicti, previsto no inciso III; 2) periculum libertatis, previsto no inciso I ou no inciso II.
Decisão do STF
De todo modo, esse imbróglio - que muitos juristas apontam como reprovável desde a existência da própria modalidade de prisão temporária - estava em discussão a partir da ADIn 4.109 que foi proposta pelo PTB, e a ADIn 3.360 pelo PSL, ambas contra a lei 7.960/89. Nesta ação, o partido destaca que "a prisão temporária, conhecida como prisão para averiguações, foi rejeitada pelo governo dos militares, por haver sido considerada flagrantemente antidemocrática." Nesse sentido, pediam a declaração de inconstitucionalidade da lei.
A maioria dos ministros do STF decidiu que é proibida a prisão para averiguações ou fundamentada em suposições. Desse modo, os juízes deverão observar, antes de decretar a prisão temporária:
se a prisão temporária é medida imprescindível para as investigações do inquérito – com base em elementos concretos, e não em "meras conjecturas";
se há razões fundamentadas para dizer que o alvo da prisão participou do crime investigado – e este crime precisa constar em uma lista específica definida na própria lei;
se a justificativa para o pedido de prisão se baseia em fatos novos ou contemporâneos ao pedido;
se a medida é adequada à gravidade do crime, às circunstâncias do fato e às condições pessoais do alvo da prisão;
se outras medidas cautelares alternativa à prisão, como o uso de tornozeleira eletrônica, não seriam suficientes para o caso.
Referências:
RIBEIRO, Diaulas Costa. Prisão temporária – Lei nº 7.960, de 21.12.89 – um breve estudo
sistemático e comparado. Revista dos Tribunais, nº 707, set. 1994.
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